terça-feira, 29 de setembro de 2009

Dá licença que eu quero passar

"Infelizmente, é a necessidade. Ninguém tá aqui por opção". Essa fala pode ser imaginada na boca de alguém em situação de subemprego ou numa fila quilométrica. Quem sabe pedindo esmolas na rua. Nada disso! Ouvi a constatação resignada numa sexta-feira, às 18h30, no Metrô Rio sentido Zona Norte.

Maria de Lourdes havia entrado no 4º carro na estação Carioca, depois de 6 horas de trabalho em uma central de telemarketing. Acostumada a ouvir um sem número de reclamações, xingamentos e todo tipo de grosseria ao longo do expediente, para ela a viagem de volta para casa é, sem dúvida, a pior parte do dia.

O tema prosseguiu entre a Uruguaiana e a Central - apenas duas estações de distância uma da outra, mas o suficiente para se perguntar que mal fizemos a deus. "Eu já aprendi. Para entrar sempre fecho o paletó, porque já quase o perdi uma vez. Imagina o prejú".

Dessa vez, quem contribuía para o diálogo era Wellington, bem mais novo, funcionário de uma empresa de informática. Seu medo não é o de ser roubado, mas de que a vestimenta seja carregada pela manada de pessoas ansiosas por entrar no vagão. "Também não quero ficar preso na porta", e riu.

A essa altura, um amontoado de gente, sem possibilidade sequer de mover um braço, ou uma perna, acompanhava a conversa e ria junto. Eu inclusive. Curioso como as ondas humanas que entram a cada parada do Metrô empurram quem é que esteja na frente rindo da situação. Quem é comprimido do lado de dentro acaba rindo também, provavelmente de nervoso, com exceção de um ou outro que pede calma - aos berros.

"Já tá chegando a Central. Aqui todo mundo desce. Por falar nisso, será que a gente consegue chegar na porta?", se mostrava preocupada Maria de Lourdes, já com os seus 50 anos. Wellington não tem dúvida. "Claro. É aí que começa o 'dá licença'. Depois é só empurrar".

Maria de Lourdes parecia não se adequar tanto ao método, mas o acompanhou. De fato, a partir dali, o Metrô segue bem mais vazio. Por sorte, meu destino é a Tijuca, bairro da Zona Norte do Rio, e ainda assisto mais uma leva considerável descer no Estácio, rumo à linha 2.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Nova onda

Dia de mar flat - sem onda. Costuma ser o fim do mundo para surfistas. Não mais para um grupo, maior a cada dia, que lançou moda no Rio, atraindo para cima de uma prancha pessoas que nunca haviam ousado dropar uma onda. A turma é adepta do Stand Up (SUP).

Quem costuma se refestelar nas areias do Posto 3 da Praia da Barra já deve ter notado uns caras deslizando sobre as águas, o tempo todo de pé sobre a prancha e com um remo em punho. Nos dias em que o mar está como uma piscina, a glória para os banhistas, o grupo aproveita para fazer travessias, como de Ipanema à Urca, ou dar um pulo nas Ilhas Cagarras.

"Não há quem não se renda a um convite para visitar a remo uma ilha próxima. As pessoas se sentem um pouco como Robinson Crusoé", conta Marcelo Kaneca, que fabrica pranchas desde 1968, e há dois anos se especializou na confecção de pranchões SUP.

O equipamento é inspirado nas canoas havaianas, que, lá mesmo, na capital do surfe, foram adaptadas para deslizar nas ondas. O resultado é uma prancha bem mais larga e comprida do que as convencionais. Consequentemente, facilita a vida dos iniciantes. A única dificuldade é encontrar o equilíbrio a cada remada. “Costumo dizer que, se você não for um quadrúpede, conseguirá ficar em pé nos primeiros 15 minutos”, completa Kaneca.

E não faltam pessoas dispostas a testar a teoria do shaper. O grupo Natiruts, autor da música Surfista do lago Paranoá, já deve estar vendo pranchas chegarem em Brasília, um dos principais compradores de Kaneca, ao lado de Minas Gerais. Se não tem mar, vai de lago e rio mesmo.

Remadão imbatível

A prancha funciona quase como um canoa, deslizando sobre a água com a ajuda do remo, uma extensão do braço. Cada remada dentro d’água equivale a cinco braçadas, o que garante mais agilidade dentro d’água. Fica mais fácil, inclusive, entrar na onda. O uso do remo, quando colocado na água com a prancha em velocidade, proporciona manobras radicais. O desafio é não largar o instrumento nas quedas.

Mas o que vem encantando surfistas experientes é a nova perspectiva de visão do praticante do SUP. De pé, o adepto pode contemplar o horizonte, ou ver peixes, em dias de água clara. Sem contar que o esporte é o sonho de qualquer fisioterapeuta por trabalhar – e muito – músculos de diversas partes do corpo, como pernas, abdômen, coluna e braço.

O disseminador do surfe Rico de Souza é um dos entusiastas da nova modalidade. Ele confeccionou sua primeira prancha de SUP há três anos, para Eraldo Gueiros, famoso big rider brasileiro. No ano passado, Rico organizou os dois primeiros campeonatos de SUP no Brasil, um deles no Rio, durante o Petrobras Longboard Classic. “As crianças e mulheres têm tido muita facilidade em aprender”, conta Rico.

Isso não quer dizer que o esporte seja bobinho. Julio Tedesco está aí para comprovar isso. O dentista é adepto do skydiving e pratica SUP há um ano. “Não sou um cara de fazer esporte bobinho”, diz. Vai encarar? É só aparecer no Posto 3 da Barra, no sábado pela manhã, que, certamente, encontrará quem o ajude com as primeiras dicas.